A ESCUTA NO CAMPO DA ENFERMIDADE: NARRATIVAS COMO INÍCIO, MEIO E FIM

Autores

  • Isabella Regina Borges Toledo
  • Maria Lucia Magalhaes Bosi

Resumo

A abordagem qualitativa no campo da saúde compreende os processos humanos a partir das vivências, discursos e narrativas de seus protagonistas. Dedica-se à subjetividade e sua análise se dá no campo do dizer - e do não dizer, contrapondo-se ao modelo biomédico e sua maneira de fazer ciência. Este é um relato de experiência que emerge da trajetória de uma estudante de medicina em seu processo de escuta e descoberta das narrativas de pacientes, com o objetivo de discorrer sobre a enfermidade como um lugar onde encontros acontecem. Em sua trilogia literária, o escritor e médico Dráuzio Varella conta suas experiências atendendo pacientes encarcerados por mais de 28 anos. As histórias que lhe chegam aos ouvidos ultrapassam a rotina comum dos consultórios e revelam a potência das experiências humanas e o que elas são capazes de dizer sobre nós. Compartilhar a própria história em um contexto de enfermidade ilustra a capacidade do narrador de se permitir estar vulnerável, como cantou Gonzaguinha em sua música “Sangrando”, na estrofe que diz: “palavra por palavra, eis aqui uma pessoa se entregando". No ensino da medicina, ao aprendermos a conduzir uma entrevista direcionada às queixas - que nos interessem, é comum nos determos num roteiro pronto, adaptado ao raciocínio que se planeja desenvolver, mas nem sempre conectado com o que o outro apresenta, com suas demandas e expectativas. Na tentativa de selecionar na fala do interlocutor os sinais e sintomas, por vezes passam despercebidos os não dizeres e o instante se perde, reduzindo a totalidade da narrativa ao que o modelo biomédico reconhece como útil e autoriza escutar. Ao construir o paradigma de uma medicina capaz de compreender o outro por meio de seu discurso, é preciso repensar a maneira como conduzir o diálogo e o lugar de quem se propõe a ouvir. Isso impõe o desenvolvimento de habilidades que escapam à formação biomédica e uma transformação na cultura da escola médica, focada na doença e não na produção de vida.

Publicado

2019-01-14

Edição

Seção

XXXVII Encontro de Iniciação Científica