A VIOLÊNCIA EM CENA: O DISCURSO TEATRALIZANTE DE QUENTIN TARANTINO

Resumo

Este estudo dá continuidade a um trabalho anterior intitulado “O exercício do acontecimento: as modulações tensivas e o efeito estético da violência na filmografia de Quentin Tarantino”, no qual propusemo-nos a investigar os procedimentos cinematográficos utilizados na filmografia do diretor e roteirista Quentin Tarantino – em particular na obra Pulp Fiction (1993) – no arrefecimento do impacto das cenas violentas e na sua estetização. A fim de averiguar, agora, o estatuto tensivo da violência em dois momentos diametralmente opostos do percurso filmográfico de Tarantino, esta pesquisa tem por meta examinar, com base na teoria tensiva de Claude Zilberberg – vertente mais recente da semiótica discursiva –, os diferentes tratamentos fílmicos dados à violência em Cães de Aluguel (1992), primeiro trabalho do cineasta, e Os Oito Odiados (2015), último lançado até então, dando especial ênfase a este último. A análise minudente permitir-nos-á verificar, afinal, que os filmes manipulam o impacto da violência de forma similar: todos eles, a partir de estratégias próprias ao cinema, se empenham em criar um efeito debreante no enunciatário em relação à narrativa fílmica e, por conseguinte, afastar o espectador dos acontecimentos caracterizadores da instância do enunciado. Os Oito Odiados, porém, em comparação com Cães de Aluguel e Pulp Fiction, salta aos olhos por tornar mais evidentes essas estratégias, explicitando, portanto, essa espécie de lugar metalinguístico no qual está alicerçada a enunciação. Nesse sentido, os procedimentos teatralizantes de construção do tempo e do espaço do filme de 2015 em muito se assemelham àqueles do de 1992; ocorre, entretanto, que, no western, a presença reguladora do enunciador parece ser recrudescida em nome de uma fruição estética extensivamente mais saturada.