Revista de Ciências Sociais — Fortaleza, v. 53, n. 1, mar./jun., 2022
DOI: 10.36517/rcs.2022.1.d07
ISSN: 2318-4620
Os empresários comerciais e o governo
Bolsonaro:
da eleição de 2018 às medidas de isolamento social durante a pandemia de
Covid-19 (2020)
Gabriel S.
Vaccari
Faculdade Integrada de Santa Maria, Brasil
gabriel.vaccari360@gmail.com
Mateus C. M. de
Albuquerque
Universidade Federal do Paraná, Brasil
mateusmartinsdealbuquerque@gmail.com
Quando pensamos nos mais destacados apoiadores do governo Bolsonaro no meio empresarial, provavelmente alguns dos primeiros nomes que vêm à mente são os de Luciano Hang (Lojas Havan), Flávio Rocha (Grupo Guararapes/Lojas Riachuelo), João Apolinário (Polishop), Sebastião Bonfim (Lojas Centauro). Em comum entre eles, o fato de serem todos oriundos do setor do grande comércio varejista. Estamos diante de mera coincidência de casos aleatórios ou de indícios representativos de um fenômeno que faz parte da dimensão estrutural e do caráter de classe do que convencionou-se chamar de “bolsonarismo”?
A relação política da elite do empresariado1 comercial brasileiro com o governo Bolsonaro constitui o objeto deste artigo. Quais são as demandas da elite do comércio? O que os empresários do setor disseram e dizem sobre o governo Bolsonaro, nas suas diferentes fases? Como o avaliam e como se posicionam politicamente diante dele? Em relação a essas questões, as entidades apresentam unidade de discurso ou se dividem? O conjunto dos segmentos do empresariado comercial apresenta uma agenda unificada de interesses e possui grau de coesão política na sua ação frente ao Estado que permita considerá-lo, em termos poulantzianos, uma fração burguesa autônoma em luta pela hegemonia dentro do bloco no poder2?
Buscamos, em primeiro lugar, identificar as demandas de política econômica presentes na agenda do setor comercial. Após, analisamos como as entidades associativas do comércio avaliam e se posicionam politicamente diante do atual governo, em especial no que diz respeito à condução da economia e da pandemia. Como ponto de partida para a pesquisa, assumimos a hipótese de que o governo Bolsonaro representa um ganho de posições dos empresários comerciais dentro do bloco de poder de Estado, evidenciado pelo atendimento sistemático por parte do governo das demandas apresentadas pelo setor, o qual reconhece explicitamente em seu discurso tal relação.
Metodologicamente, realizamos uma análise de conteúdo (AC) das manifestações discursivas das entidades dos comerciantes. Análises de produções discursivas envolvem o estudo de toda manifestação, escrita ou falada, em texto ou em vídeo, de lideranças/organizações empresariais em defesa explícita de determinados interesses, valores e concepções: artigos de jornais, intervenções em periódicos, falas em eventos, entrevistas concedidas à imprensa, campanhas publicitárias, publicações de imprensa das entidades de classe (CODATO; PERISSINOTO, 2009). A AC pode ser definida como uma “técnica de análise de comunicações que busca classificá-las em temas ou categorias que ajudem a desvendar o que está por trás do discurso, com intuito de produzir inferências de um texto para seu contexto social de forma objetiva” (BAUER; GASKELL, 2002, p. 32). Para Bardin (1979), tal método envolve iniciativas de explicitação, sistematização e expressão do conteúdo de mensagens, com a finalidade de efetuarem-se deduções lógicas e justificadas a respeito da origem, do significado e do alvo dessas mensagens (quem as emitiu, em que contexto e/ou quais efeitos se pretende causar por meio delas), buscando explicitar o que está subentendido na mensagem. O enfoque é “revelar intenções e diretrizes políticas e suas possíveis relações com os contextos históricos e conjunturais. Parte-se da estrutura do texto para interpretá-lo, considerando-o como ilustração de uma situação limitada ao seu próprio contexto” (SILVA; RIBEIRO; CARVALHO, 2015, p. 349).
A AC combina as dimensões quantitativa e qualitativa. Quantitativamente, a preocupação é a frequência com que surgem determinados elementos nas comunicações, mensurando as significações identificadas. Em termos qualitativos, a atenção volta-se para a presença ou a ausência de um conjunto de características nas mensagens analisadas, ultrapassando o alcance meramente descritivo das técnicas quantitativas e atingindo interpretações mais profundas com base em inferências (BARDIN, 1979). Temos consciência de que as opiniões/posições/avaliações/valores/ideologias presentes no discurso empresarial, por mais significativas que possam ser, não nos autorizam, porém, a fazer inferências mais amplas sobre as formas de ação política concreta dos comerciantes. Esta é uma limitação do nosso recorte do objeto.
A pesquisa divide-se em três ciclos temporais: a campanha do candidato Bolsonaro em 2018; o primeiro ano de governo, em 2019; e a pandemia de Covid-19, em 2020. Partimos da suposição de que os comerciantes (i) constituem uma fração burguesa autônoma que disputa ativamente a hegemonia no interior do bloco no poder; (ii) prestaram apoio público e/ou velado à candidatura de Bolsonaro; (iii) apostaram fortemente na agenda de austeridade/reforma liberais prometida pela equipe econômica capitaneada pelo ministro Paulo Guedes; e (iv) formaram parte importante da base social de sustentação à estratégia do governo federal diante da pandemia de Covid-19.
Nossas fontes são (a) matérias, artigos de opinião, declarações e entrevistas de empresários do setor veiculadas na imprensa; e (b) os materiais extraídos dos sites da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) e do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV). Seguimos as sugestões metodológicas de Schimitter (1971) e Leopoldi (2000) de tomar as entidades e associações representativas como objetos privilegiados para o estudo do comportamento político empresarial em sua forma institucionalizada.
O texto está organizado em cinco partes, inclusa esta Introdução. No próximo excerto, tratamos brevemente do histórico da agenda de pesquisa “empresários na política”, passando pelos poucos estudos sobre a burguesia comercial brasileira. Na terceira parte, descrevemos a organização das quatro associações que nos servem de objeto. Na quarta, de maneira sucinta, apresentamos uma caracterização geral do governo Bolsonaro. Após, um tópico expositivo de nossas fontes e métodos de pesquisa, acrescidos da exposição dos resultados que encontramos. Por fim, as conclusões e as questões que permanecem abertas na agenda de pesquisa.
Há uma longa e rica tradição de pesquisas nas Ciências Sociais brasileiras sobre os empresários como atores políticos. Troiano (2014) divide a história da literatura desse campo em quatro ciclos temporais, marcados pela correlação entre as conjunturas políticas atravessadas pelo Brasil no século XX e as ênfases/temas das análises. A primeira ênfase dos estudos recaiu sobre as relações entre empresários e Poder Executivo Federal no contexto do sistema corporativista inaugurado com o Governo Vargas, que institucionalizou a presença dos empresários na arena estatal. A segunda ênfase esteve vinculada ao período do golpe de 1964 e à ditadura civil-militar, quando o foco das análises se concentrou na atuação dos empresários nas agências estatais, formando “anéis burocráticos” dentro do aparelho de Estado. A terceira destacou o período da transição política da década de 1980, quando, com a redemocratização, a representação empresarial se prolifera em uma série de associações civis alternativas ao modelo corporativo e passa a atuar com mais força junto ao Poder Legislativo. A quarta e última ênfase deu sequência à terceira, evidenciando a permanência da atuação empresarial no Legislativo ao longo da República de 1988 na forma de lobbies e grupos de pressão.
Mancuso (2007) considera que, desde a década de 1950, uma questão fundamental a estruturar o debate tem sido estabelecer se o empresariado que atua no Brasil é um ator político forte ou fraco. Partindo da definição de ator político “forte” como sendo aquele “cujos interesses coletivos são refletidos sistematicamente pelas decisões não-ilegais do poder público”, o autor identifica cinco ondas sucessivas de trabalhos “em que a visão predominante sobre a força política do empresariado nas obras que formam uma onda é questionada pela visão prevalecente na literatura que compõe a onda posterior” (MANCUSO, 2007, p. 3).
A primeira onda remete a autores ligados ao Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) que consideravam o empresariado industrial nacional um ator político com força suficiente para liderar uma aliança com os trabalhadores em torno de uma revolução “nacional e democrática” contra as forças do latifúndio e do imperialismo. Trata-se do debate clássico, com fortes consequências políticas, sobre a existência e o papel da “burguesia nacional”. Já na segunda onda, que se estende do pós-golpe de 1964 até a década de 1970, o argumento dominante passou a ser que o empresariado nacional seria fraco e não almejaria a aliança com os trabalhadores, pois aliado do atraso, preferindo o papel de “sócio menor do imperialismo”.
Na terceira onda de interpretações, gerada no contexto da crise da ditadura e da transição para a democracia, os trabalhos passam a sustentar a força do empresariado, manifestada, no longo prazo, no sucesso da burguesia em influenciar o processo de industrialização em todas suas fases, na sua unidade e organização para derrubar o governo João Goulart e, posteriormente, na campanha pela “desestatização” da economia e no apoio à redemocratização. Iniciada nos anos 1990, a quarta onda é a de autores brasilianistas que atestam a fraqueza política do empresariado, resultante da dificuldade crônica de eles, enquanto grupo, construírem ações coletivas em torno de plataformas unificadas. Tal debilidade política é atribuída ao sistema corporativista de representação de interesses, o qual, por sua estrutura, geraria lideranças e entidades pouco representativas dos seus setores e impediria a formação de uma entidade de cúpula capaz de agregar o conjunto dos setores empresariais.
Por fim, na quinta e mais recente onda, os trabalhos publicados na década de 2000 se contrapõem às teses brasilianistas, mostrando que, no processo de abertura econômica neoliberal dos anos de 1990, os empresários teriam apresentado, inclusive em suas entidades corporativistas, capacidade de formação de uma agenda unificada e de empreendimento de ações coletivas. Em acréscimo temporal à sistematização de Mancuso (2007), nos parece que, considerando a produção do campo na década de 2010, o foco das análises foi dirigido especialmente à relação política dos empresários com os governos petistas e a maior parte da literatura deu continuidade à tendência da quinta onda, ou seja, permaneceu interpretando o empresariado como ator político forte (BOITO, 2012, 2018; BRESSER-PEREIRA, 2015; DINIZ, 2010; IANONI, 2018; SINGER, 2015, 2018).
Outra dimensão a ser considerada na avaliação da literatura é a distribuição desigual da atenção dos estudiosos sobre os diferentes segmentos empresariais (BOITO, 2007). O setor industrial é o maior foco das análises. O setor agrário vem em seguida. Assim como o setor financeiro, a burguesia comercial, nosso objeto, é tema de um número de análises relativamente bastante reduzido. No tocante aos comerciantes como atores políticos, destacam-se os trabalhos de Paulo Roberto Costa que analisam as relações entre os padrões de ação coletiva desse segmento empresarial e os arranjos político-institucionais de diferentes momentos da história brasileira, enfocando, em um primeiro estudo, a ação da Federação Comercial do Estado de São Paulo junto ao Legislativo Federal na década de 1950 (COSTA, 1998) e, após, as ações daquela mesma entidade e da Associação Comercial do Estado de São Paulo no contexto do processo de transição política da redemocratização e início da Nova República, entre 1984 e 1994 (COSTA, 2003). Diferentemente dos trabalhos desse autor, cujo foco é concentrado nas relações entre organizações empresariais e regimes políticos, nosso problema se alinha a um tema mais tradicional na literatura, a saber, a relação de empresários com a política econômica de governos específicos. Em comum com Costa, a tentativa de contribuir com a diminuição da carência de pesquisas a respeito da elite empresarial do comércio.
Nesta seção, de forma sintética, resgatamos a história, descrevemos a organização e identificamos os principais porta-vozes das entidades representativas do empresariado comercial sobre as quais dirigimos o foco da pesquisa.
A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo é a entidade sindical de grau máximo, a cúpula corporativa dos empresários do setor terciário da economia. Fundada em 1945, a entidade coordena o Sistema Confederativo da Representação Sindical do Comércio (Sicomércio), formada por 34 federações patronais (27 estaduais e 7 nacionais), que agrupam mais de mil sindicatos de diversos segmentos, entre os quais o comércio atacadista e varejista, agentes autônomos, comércio armazenador, turismo e hospitalidade e estabelecimentos de serviços de saúde. A CNC também administra o Serviço Social do Comércio (Sesc) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), que integram o chamado “Sistema S”. Como porta voz oficial do comércio diante do Estado, a CNC tem participação em diversos órgãos burocráticos, tais como o Banco Central, o Conselho Interministerial de Preços, o Conselho Nacional de Petróleo, a Escola Superior de Guerra e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
A administração da CNC é exercida pelo conselho de representantes, formado por delegações das federações filiadas; pela diretoria, eleita trienalmente pelo conselho de representantes e composta de 50 membros; e pelo conselho fiscal, integrado por três elementos, também trienalmente eleitos pelo conselho de representantes. A diretoria é formada por um presidente, 12 vice-presidentes, três secretários, três tesoureiros e seis diretores sindicais, além dos membros suplentes. No período em tela neste trabalho, 2018-2020, a entidade é presidida por José Roberto Tadros, cujo mandato vai até 2022.
Fundada em 1960, a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas é a entidade civil de Cúpula do Sistema CNDL, que congrega as Federações Comerciais de Dirigentes Lojistas (FDCL) dos 27 estados brasileiros e 2.000 Câmaras de Dirigentes Lojistas (CDLs) municipais, contando com cerca de 500 mil empresas filiadas em sua base. A entidade estipula como seus objetivos uma “representação eficiente e unificada dos interesses do varejo”, formulando “diretrizes econômicas, políticas e sociais” para dirigir o setor. Sua diretoria é composta por um presidente, 7 vice-presidentes, 23 diretores e 10 Conselheiros. A presidência é ocupada desde 2017 pelo empresário mineiro José César da Costa.
Fundada em 1912, a Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil é uma associação civil que congrega 27 federações estaduais de associações comerciais, industriais e agrárias, as quais, por sua vez, são constituídas de 2.300 associações municipais, totalizando em torno de dois milhões empresários. As duas principais instâncias da entidade são o Conselho Diretor, órgão deliberativo máximo, constituído pelos presidentes das federações estaduais, e pela Diretoria, órgão executivo-administrativo formado pelo presidente e dez vice-presidentes. Desde 2016, a CACB é presidida pelo empresário acreano George Pinheiro. Os artigos de sua autoria, publicados no website da entidade, são a fonte que utilizamos para analisar as posições da associação.
O Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV) foi fundado em 2004 por iniciativa dos empresários Flávio Rocha (Riachuelo/Guararapes), Luíza Trajano (Magazine Luíza), Marcos Gouvêa de Souza (consultoria GS&MD) e Artur Grynbaum (Boticário), unidos pela “insatisfação diante do silêncio das entidades que representavam o setor de varejo” (IDV, 2014). Inspirado no modelo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (IEDI), o IDV surgiu para representar o varejo como grupo de interesse frente ao poder público e também para produzir e difundir conhecimentos sobre assuntos estratégicos, com vistas a influenciar transformações sociais, políticas, econômicas, ou seja, um think thank.
Atualmente, o IDV conta com 74 empresas associadas,3 todas de grande porte, o que garante significativo peso à entidade, mesmo que sua base tenha um número pequeno de empresários quando se considera o conjunto de empresas que formam setor comercial brasileiro.
A diretoria do Instituto conta com um presidente e dois vice-presidentes. No recorte temporal deste trabalho, o IDV foi presidido por Antônio Carlos Pipponzi (até abril de 2019) e Marcelo Silva, que segue no comando. O Conselho é formado por 14 membros.
Antes de expormos os resultados da análise dos dados, cabe uma pequena caracterização geral do governo Bolsonaro em termos de projeto e de coalizão social de sustentação.
Resultante da crise de legitimidade que acometeu o sistema político e partidário no contexto da combinação de crises e forte instabilidade experimentadas pelo país entre 2013 e 2018, o governo Bolsonaro encampa como projeto uma forma radicalizada de neoliberalismo autoritário. Reacionário nos costumes, autoritário na política, mercadista na economia (LYNCH, 2020). De um lado, a agenda ultra-regressiva em termos de políticas de reconhecimento, buscando restaurar as hierarquias tradicionais rígidas de dominação patriarcal e racial e reverter as tendências de modernização cultural dos costumes, corpus ideológico que passou a ser identificado como “olavismo” (em referências às ideias de Olavo de Carvalho) e que apresenta grande afinidade com o discurso de extrema-direita encampado por Bolsonaro em suas quase três décadas como parlamentar. De outro, a agenda econômica de aprofundamento da ofensiva neoliberal iniciada no governo Temer, que visa abrir espaço para novo ciclo de acumulação de capital por meio de reformas constitucionais, desregulamentações, privatizações e políticas de austeridade orientadas para a redução dos custos da força de trabalho e para a desconstrução do ensaio de Estado de Bem Estar Social projetado na Constituição Federal de 1988, a qual, por “não caber no orçamento” , seria responsável estrutural pelo desequilíbrio fiscal crônico que marcaria o Estado brasileiro, conforme o diagnóstico da ortodoxia liberal (CARVALHO, 2019; DWECK, 2020) .
Cimentada pela fórmula neoliberal-reacionária e pela rejeição à experiência petista, a coalizão sócio-política de sustentação do governo reúne evangélicos neopentecostais, militares, partidos de direita tradicional, mercado financeiro, ruralistas e empresários (ANDERSON, 2019; COUTO, 2021). Os evangélicos foram decisivos para a eleição de Bolsonaro e formam a principal base de apoio popular de seu mandato. Os militares, especialmente do Exército, formam a espinha-dorsal da administração federal, ocupando milhares de cargos na máquina estatal e com maior presença no gabinete ministerial do que nos próprios governos da ditadura de 1964-85. Os partidos fisiológicos de direita tradicional do Congresso Nacional, designados comumente sob a alcunha de “centrão”, preteridos ao longo de 2019 pelo governo, que em um primeiro momento não buscou formar base parlamentar estável, passaram a dar sustentação legislativa a Bolsonaro a partir da metade de 2020, quando a hipótese impeachment apareceu no debate público.
Entre diferentes frações do empresariado, a equipe liberal liderada pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, aparentemente ainda inspira confiança e garante grau significativo de apoio do capital a Bolsonaro (BOITO, 2021; DEL PASSO; VALLE, 2021; ROCHA, 2020). Por conta de ser um fenômeno muito recente, com pouco mais de dois anos de duração até o momento da redação deste artigo, a literatura sobre a relação entre empresariado e o atual governo é ainda bastante incipiente. Contribuição importante para essa agenda de pesquisa é o artigo de Bortone (2020) sobre o apoio empresarial à Bolsonaro ao longo da disputa eleitoral e que apresenta como um de seus resultados a constatação de que o candidato do PSL foi “apoiado e financiado por frações empresariais, mais precisamente a burguesia comercial, do varejo” (BORTONE, 2020, p. 63). A análise que segue é, pois, em alguma medida, uma continuidade do esforço analítico iniciado por Bortone.
Para realizar este estudo, utilizamos como fonte de pesquisa materiais diversos: o website da CNC, onde buscamos os índices de confiança dos empresários do comércio e as “Sínteses de Conjuntura”; o website da CNDL, no qual buscamos as “Cartas do Presidente” desta entidade; a subseção “IDV na Mídia”, parte da seção “Sala de Imprensa” do site IDV; a subseção “Artigos”, do website da CACB. Nesta base empírica, buscamos comentários relativos à política econômica do governo contidos nos textos disponibilizados pelas associações. Os comentários foram então categorizados em três rótulos, que podem ser visualizados abaixo:
Quadro 1 — Rótulos usados na coleta do posicionamento do empresariado
Rótulo | Significado |
---|---|
Positivo “p” | Comentário positivo sobre a política econômica do governo |
Negativo 1 “n1” | Comentário crítico à política econômica do governo |
Negativo 2 “n2” | Comentário crítico a uma política econômica específica do governo, mantendo-se vinculado discursivamente ao governo |
Elaborado pelos autores. |
Também diferenciamos a nossa coleta pelo recorte temporal abarcado pelo artigo. Nesse sentido, inserimos como marco inicial o dia 05/08/2018, começo da campanha presidencial de 2018; como data inauguradora do segundo período o dia 01/01/2019, posse presidencial de Jair Bolsonaro; e o estabelecimento da Covid-19 como pandemia no território nacional como o marco do terceiro período, no dia 11/03/2020. Encerramos o período da análise ao fim do segundo ano do governo Bolsonaro.
Quadro 2 — Períodos abarcados no estudo
Rótulo | Período abarcado |
---|---|
Período 1 “p1” | 05/08/18 – 31/12/2018 |
Período 2 “p2” | 01/01/2019 – 10/03/2020 |
Período 3 “p3” | 11/03/2020 – 31/12/2020 |
Elaborado pelos autores. |
No caso das associações empresariais, identificamos 21 temáticas referentes a proposições e demandas direcionadas ao governo. Essa identificação se deu a partir da leitura do próprio texto, conforme a construção de unidades de codificação proposta por Bardin (1979). Assim, ao invés de a unidade de análise ser uma ferramenta de busca no texto, o próprio texto produz a unidade de análise. Categorizamos estas proposições e demandas nos seguintes rótulos: a) Reforma da Previdência; b) Reforma Tributária; c) Teto de gastos; d) Reforma Trabalhista; e) Concessões e Privatizações; f) Contra a independência do BC; g) Defesa do Sistema S; h) MP da Liberdade Econômica4; i) Redução dos Juros; j) Reforma Administrativa; k) Alargamento do Crédito; l) Proteção às Empresas na Pandemia; m) Reabertura do Comércio na Pandemia; n) Renda Brasil; o) Gestão das Estatais; p) Cadastro Positivo; q) Combate à falsificação; r) Regulação dos Bancos; s) Regulação dos Free Shops; t) Pacto Federativo; u) Gestão das Estatais.
Para observar um posicionamento mais generalizado dos empresários enquanto indivíduos, incluindo todos os setores do comércio, utilizamos o “Índice de Confiança dos Empresários do Comércio” (ICEC), indicador calculado mensalmente pela CNC, tendo como base seis mil empresários localizados em todas as capitais do país. O ICEC é uma soma de três outros indicadores: o Índice de Confiança Atual dos Empresários do Comércio (ICAEC, que mede a confiança no cenário presente); o Índice de Expectativas dos Empresários do Comércio (IEEC, que mede as expectativas dos empresários quanto ao futuro) e o Índice de Intenção de Investimentos dos Empresários do Comércio (IIIEC, que mede a intenção em investir). Calculamos as médias dos quatro índices nos três períodos analisados neste artigo, como se pode ver no gráfico abaixo.
Gráfico 1 — Variação nos índices que compõe o Índice de Confiança dos Empresários do Comércio nos três períodos elencados no artigo |
Fonte: CNC (2021a). Elaborado pelos autores. |
É visível, nos três ciclos, a permanência do sentimento de desconfiança. Entretanto, ele é consideravelmente menor no período do primeiro ano de governo, anterior à pandemia. A partir disso, é possível robustecer a ideia de que havia considerável simpatia às reformas e às medidas do governo, especialmente quando observados os índices referentes ao presente (ICAEC e IIEC), os que mais variam no interregno p2. Ou seja, o que mais variou durante todo o período de agosto de 2018 até dezembro de 2020 foi o desejo de investir e a confiança na situação política corrente.
Para medir a percepção geral das associações comerciais em relação ao governo Bolsonaro, selecionamos os seguintes documentos. No caso da CNC, analisamos as 53 “Sínteses de Conjuntura” publicadas no período. As Sínteses, de autoria do ex-ministro da Fazenda Ernane Galvêas, são publicadas quinzenalmente no site da entidade. Em relação ao CNDL, nos debruçamos sobre 24 documentos intitulados “Palavra do Presidente”, escritos mensais do líder executivo da entidade. Também analisamos as notícias presentes no “IDV na Mídia”/“Sala de Imprensa”, do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV). Enfocamos 43 destas notícias, de diferentes veículos de mídia, em que dirigentes do IDV ou varejistas associados ao Instituto dão declarações quanto à conjuntura econômica. No caso do IDV, encontramos notícias apenas a partir do ano de 2019, ou seja, nos recortes “p2” e “p3”. Por último, escrutinamos os textos publicados na seção “Artigos”, do website da CACB, os quais são assinados pelo empresário acreano George Pinheiro, presidente da entidade.
Com base nesse conjunto de fontes de coleta de declarações, chegamos à identificação da evolução valorativa do discurso empresarial que se observa no segundo gráfico:
Gráfico 2 — Evolução do tipo de posicionamento apresentado nos documentos estudados da CNC, do CND, do IDV e do CACB |
Fonte: CNC (2021), CNDL (2021), IDV (2021), CACB (2021). Elaborado pelos autores. |
É possível notar no discurso das associações uma elevada presença de comentários positivos em relação à política econômica do governo. O indicador positivo tem presença maior que a soma dos dois indicadores negativos. O período “p1” aparece integralmente positivo, mas cabe frisar que, pela não presença do IDV no corpus, o seu n de análise é muito pequeno. Nos casos “p2” e “p3” há um aumento na proporção de comentários negativos em relação aos positivos, embora seja notável a redução no volume de posicionamentos a partir de “p3”. Em comparação ao primeiro ano de mandato, no período pandêmico, aparentemente, as associações optaram por uma postura mais silenciosa, portanto.
Nos excertos seguintes, passamos a abordar as proposições apresentadas por cada uma das associações durante os três recortes temporais. É importante fazer esta separação no eixo propositivo pelo alto grau de diferença substantiva existente entre as diferentes entidades analisadas. Assim, também, pode-se compará-las e identificar o grau de unidade e/ou divergência que apresentam.
“Síntese de Conjuntura”, da Confederação Nacional do Comércio (CNC)
Gráfico 3 — Proposições econômicas presentes nas “Sínteses de Conjuntura” da CNC |
Fonte: CNC (2021). Elaborado pelos autores. |
As “Sínteses” da CNC são escritas pelo ex-ministro da Fazenda Ernane Galvêas. No seu corpo, além de comentários axiomáticos quanto à política econômica, existem também seções de indicadores econômicos e a apresentação de notas noticiosas, sem exposição de posicionamento do autor. São publicadas quinzenalmente. Algumas das edições circulam como parte de outro documento da CNC, a “Carta Mensal”, que apresenta também textos de natureza histórica e filosófica sobre a política e o comércio brasileiro. Nas “Sínteses”, é notória a presença da defesa das reformas, especialmente a previdenciária e tributária, como agenda imperante da Confederação no período pré-eleitoral e durante o primeiro período do mandato de Bolsonaro, em 2019. A Confederação defende suas próprias visões de reforma. Quanto à previdência, defende a junção dos regimes públicos e privados e a idade mínima. Quanto à reforma tributária, é partidária da fusão de impostos, além da priorização da desoneração da folha. Com a aprovação da reforma da previdência, em 2019, Galvêas chegou a afirmar que a reforma tributária seria ainda mais relevante que a previdenciária. Outro elemento importante é o apoio à MP da Liberdade Econômica.
Além das reformas, Galvêas faz defesas de interesse de fração de classe específicos. A CNC, parte do Sistema S, elabora críticas tenazes às propostas do governo de reduzir os repasses ao Sistema, apresentando argumentos econômicos em favor dos benefícios de manter o Sistema. É digna de nota também a presença, nos textos, de críticas à proposta de independência formal do Banco Central, indício de conflitos com a fração financeira da burguesia, principal defensora da medida.
No que tange à pandemia, são poucas as situações em que a CNC defende de maneira propositiva medidas de socorro ao comércio ou reabertura do comércio. Como é perceptível no gráfico 3, o fenômeno mais notável é o silêncio público: diminuem consideravelmente as proposições e os diálogos diretos com o governo em relação ao período anterior.
“Palavra do Presidente”, da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL)
Gráfico 4 — Proposições econômicas elencadas pela “Palavra do Presidente” da CNDL |
Fonte: CNDL (2021). Elaborado pelos autores. |
A “Palavra do Presidente” é um texto curto, de caráter institucional. Nele, o presidente se dirige aos associados, tratando de muitos temas específicos não-políticos, como a importância de certas datas comemorativas para o comércio, a “força da mulher lojista” etc. Entretanto, é possível identificar algumas reivindicações nestes documentos.
No período eleitoral, o CNDL se absteve dos debates eleitorais, limitando-se à defesa genérica do retorno do crescimento econômico. No primeiro ano de mandato, porém, o presidente da associação deixa claro que conta com “um governo e um Congresso Nacional alinhados aos nossos ideais, favoráveis ao nosso setor e às nossas demandas” (COSTA, 2019a). Esse alinhamento se dá por um endosso repetido às reformas da previdência e tributária e à MP da Liberdade Econômica. Há também a publicização de pautas específicas de interesse corporativo dos lojistas, como o combate à pirataria e a implementação do Cadastro Positivo, programa de cadastros unificados das centrais de cobrança para reduzir a inadimplência. No relato de uma reunião com o governo sobre essa pauta, encontramos uma passagem significativa: “Pautas importantes para o Sistema CNDL (...) nos conferiram um status inédito junto às autoridades políticas, ao alto escalão do Governo Federal e à mídia nacional” (COSTA, 2019b).
No período 3, com a Covid-19, o discurso da CNDL reduziu sua dimensão propositiva. Um ponto notório é que, somado à solicitação por auxílio da parte do governo para as empresas, o CNDL propôs que o comércio se mantivesse fechado: “Tornou-se fundamental sensibilizar o setor varejista para o fato de que o número de pessoas infectadas só será baixo se o contato for evitado” (COSTA, 2020). Como socorro aos empresários, o CNDL demandou a suspensão do recolhimento de impostos como o ICMS e o ISS e a suspensão dos contratos de trabalho, com acesso ao seguro-desemprego.
“Sala de Imprensa”, do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV)
Como as notícias compiladas no clipping “IDV na mídia” da “Sala de Imprensa” do IDV não contemplam apenas declarações dos presidentes da entidade, mas também de empresários filiados ao Instituto, elaboramos uma tabela que demonstra quem fez as declarações e em que quantidade.
Tabela 1 — Quantidade de declarações por empresário declarante nas notícias presentes na “Sala de Imprensa” do IDV
Declarante | N |
---|---|
Marcelo Silva (pres IDV 19/20) | 11 |
Flávio Rocha (Riachuelo) | 10 |
Antonio C. Pipponzi (Drogasil / pres IDV 18/19) | 6 |
Luiza Trajano (Magazine Luiza) | 5 |
Sérgio Zimmerman (Petz) | 2 |
Abílio Diniz (Península) | 1 |
Marcelo Pimentel (Marisa) | 1 |
João C.Brega (Whirpool) | 1 |
Fonte: IDV (2021). Elaborado pelos autores. |
Excetuando Marcelo Silva e Antônio Pipponzi, presidentes do IDV durante os períodos avaliados, nota-se a ampla participação de Luiza Trajano e, especialmente, de Flávio Rocha como porta-vozes do grupo.
Gráfico 5 — Proposições econômicas trazidas pelas notícias encontradas na “Sala de Imprensa” do IDV |
Fonte: IDV (2021). Elaborado pelos autores. |
No período 2, primeiro ano do mandato de Bolsonaro, é possível identificar um enfoque intenso na agenda das reformas, especialmente a previdenciária e tributária. Algumas das notícias selecionadas indicam pressões para que governo e Congresso acelerem a aprovação e implementação delas: “o adiamento das reformas econômicas prometidas pode, aos poucos, minguar o capital político adquirido pelo governo Jair Bolsonaro (PSL)” (CUNHA; SOPRANA, 2019). Em algumas das notícias, os empresários apontam como “relativo” o apoio a Bolsonaro, temendo que ele não constitua maioria para conseguir as reformas (SCARAMUZZO et al, 2019). Quanto à Reforma Tributária, os varejistas do IDV se apresentam como contrários às propostas circulantes na Câmara, defendendo a proposição do então secretário da Receita Federal Marcos Cintra: o retorno de uma espécie de CPMF e a desoneração da folha de pagamentos (ROCHA, 2020).
Durante o período pandêmico, a agenda das reformas segue sendo pautada, mas é bastante ofuscada pelas questões impostas pela emergência sanitária. De início, os empresários do IDV demandaram auxílio ao setor e abertura gradual e segura (MATTOS, 2020). Em pouquíssimo tempo, o tom dos empresários ligados ao IDV passou a ser dotado de maiores tons de impaciência, chegando ao ponto de ameaçar demissões em massa caso o comércio não pudesse abrir (WIZIACK, 2020). Todas as notícias posteriores apontam uma cobrança intensa pela reabertura, criticando a adoção do isolamento como estratégia de combate.
Outro elemento que se acentuou na pandemia foi a crítica do Instituto ao setor financeiro. Em 2019, o IDV já havia criticado o excesso de concentração do setor bancário e seus efeitos para o encarecimento do crédito fornecido ao setor produtivo (EMPRESÁRIOS, 2019). Em 2020, o think thank passou a defender a intervenção do governo para forçar o setor financeiro a alargar o crédito fornecido (ESTÃO, 2020; ANDRADE, 2020). Também aparecem, no discurso dos empresários ligado ao instituto, questões corporativas específicas, como a defesa de restrição para a atuação de free shops em aeroportos.
“Artigos”, da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB)
Gráfico 6 — Proposições econômicas trazidas pelos textos da seção “Artigos”, da CACB |
Fonte: CACB (2021). Elaborado pelos autores. |
No período eleitoral, o CACB foi claramente a entidade mais explícita em seu apoio ao candidato da extrema-direita, se apresentando publicamente como “aliada de primeira hora ao candidato Jair Bolsonaro” (PINHEIRO, 2018). Há nesses textos forte reivindicação das reformas, colocadas no plural e sem especificar quais, afirmando que, sem elas, a economia não andaria.5 Cabe notar um elemento excepcional dessa entidade: a defesa de uma melhor gestão das estatais, sem mencionar a sua privatização (PINHEIRO, 2019a), distintamente que aparece em entidades como o IDV e a CNC, que pautam diretamente as privatizações. No primeiro ano do governo, o apoio ao governo é mantido. Em relação à reforma da previdência, George Pinheiro defende a integridade do modelo proposto pelo governo, pleiteando que ele não seja desidratado (PINHEIRO, 2019b). Também comemoraram a aprovação do Cadastro Positivo, pauta setorizada dos varejistas (PINHEIRO, 2019c). Outro elemento importante, que aparece com frequência particularmente forte nessa entidade, é a defesa da reforma do pacto federativo (PINHEIRO, 2019d).
Assim como a CNC, o período 3, da pandemia, representou uma considerável queda na quantidade de posicionamentos da CACB. Neste, foram publicados apenas dois textos, ambos defendendo o uso de recursos públicos para salvar empresas da falência, inclusive traçando um paralelo entre essa transferência de recursos e o auxílio emergencial (PINHEIRO, 2020a; 2020b). Estes dois textos foram publicados nos meses de março e maio de 2020, ou seja, na fase inicial da pandemia. A seção de artigos só voltou a ser atualizada em 2021, fora de nosso recorte temporal. Em resumo, não há demanda pelo retorno das atividades comerciais porque o CACB se absteve de se posicionar publicamente durante todo o primeiro ano da pandemia.
Abrimos este trabalho questionando se há uma coesão entre os empresários do comércio brasileiro em relação ao governo Bolsonaro que nos permita considerá-los como uma fração autônoma da burguesia que disputa hegemonia no bloco do poder. A partir da análise dos documentos de quatro entidades comerciais, não conseguimos chegar a um resultado conclusivo. Há, por um lado, grande multiplicidade de pautas circulantes que parecem não garantir uma unidade. Por outro, a pauta unitária que aparece no discurso das associações é a defesa das reformas neoliberais, mas estas não podem ser consideradas o programa específico de uma burguesia comercial, pois são bandeiras gerais das frações da burguesia em seu conjunto, visando a ampliação de sua acumulação, como apresentado por Wetherly (2008), em sua polêmica com autores de matrizes poulantzianas. Pode-se considerar também, como hipótese interpretativa, que essa dificuldade de identificar uma agenda unitária própria do setor comercial que não se reduza a um miríade de demandas corporativas específicas de determinados segmentos nem se dilua em pautas gerais da burguesia no seu todo, resulte de uma espécie de divisão de trabalho político interna tácita entre as associações, em que algumas entidades vocalizam publicamente as demandas e outras, embora nem sempre se manifestem diretamente, prestam apoio passivo velado a elas.
Aqui ainda restam, portanto, mais dúvidas que certezas para nossa pesquisa. Tampouco é possível observar uma ação coordenada que unifique os comerciantes como fração de classe que disputa hegemonia do bloco no poder — porém, isso talvez diga mais respeito ao limite de nosso método de análise de conteúdo de produções discursivas do que aos desdobramentos concretos do fenômeno em si. Ausência de evidência não é necessariamente evidência de ausência. Desse modo, os dados empíricos levantados na pesquisa, até o presente momento, não nos permitem nem corroborar nem falsear completamente nossa primeira hipótese: a dimensão discursiva da atuação política das entidades do empresariado comercial, objeto de análise deste artigo, não nos permite conceituá-la nem descartá-la como uma fração de classe com efeitos políticos pertinentes. Para tanto, precisamos aprofundar a pesquisa e utilizar também outros métodos que permitam captar as formas concretas de ação coordenada dos empresários do segmento diante do Estado.
No período eleitoral de 2018 é visível que, entre as entidades, a postura é institucional e mais comedida, mas não se verificam críticas ao candidato e elas manifestam forte otimismo com a agenda de reformas neoliberais prometidas por Paulo Guedes. Uma exceção notória é a CACB, que expressa publicamente seu apoio efusivo à eleição de Bolsonaro.
Durante o primeiro ano de mandato, 2019, se por um lado a média dos índices de confiança registram uma avaliação negativa do setor sobre o desempenho da atividade econômica, por outro, há oscilação positiva nos índices presentes em relação ao ano anterior. Nesta toada, as entidades associativas demonstram grande apoio à agenda econômica do governo, especialmente no caso da Reforma da Previdência e da MP da Liberdade econômica. Outra reivindicação constante e explícita é por uma Reforma Tributária capaz de simplificar e desburocratizar o sistema de impostos, bem como diminuir a carga de tributos. A postura dos comerciantes em relação à reforma tributária não é meramente de apoio passivo aos desenhos projetados pelo governo. São ativos e propositivos, pautando medidas mais detalhadas. Além das reformas econômicas gerais, interesses específicos e corporativos movem as entidades, como a defesa do Sistema S, o Cadastro Positivo, a regulação dos Free Shops e o combate à pirataria. Observa-se, também, uma fricção do setor com a fração bancária da burguesia em torno de demandas como a ampliação do acesso ao crédito. A CNC se insurge em mais de um momento contra a proposta de independência formal do Banco Central. Os empresários do IDV defendem a redução da concentração do setor bancário através de regulação estatal.
No contexto da pandemia de Covid-19, as entidades e os empresários individuais são uníssonos na demanda por socorro estatal diante da paralisia da atividade econômica produzida pelo vírus e pelas políticas de isolamento. Aumento da oferta e redução do custo do crédito, flexibilidade na cobrança de tributos, ajuda governamental no pagamento de salários e flexibilizações emergenciais da legislação trabalhista são algumas das pautas unificantes do setor no período 3 da análise.
Quanto às medidas de isolamento, os dados em um primeiro momento contrariam e em um segundo momento atestam nossa hipótese inicial. Nos primeiros meses, entidades e empresários apoiaram as medidas de isolamento e adotaram um discurso de respeito às recomendações científicas, considerando que seria inócuo reabrir as empresas sem controlar o vírus, pois o medo da população deprimiria a demanda. Porém, em um segundo momento, quando começa a ficar evidente que a pandemia teria uma duração maior do que se supunha no início, o setor começa a dividir-se, e uma parte cada vez mais expressiva dos empresários passa a ser crítica às medidas de isolamento por conta de seu impacto econômico — postura vocalizada especialmente pelo IDV.
Há uma tendência de apoio passivo ao modo Bolsonaro de tratar a pandemia. É um momento em que se observa também um silêncio público maior por parte de porta-vozes das entidades, talvez por conta da divisão de posições em suas bases de associados. Podemos aqui extrair um novo caminho investigativo interessante, tendo em vista que o IDV parece ser o grupo de pressão que mais se adequa aos postulados apresentados nas hipóteses investigativas desse estudo.
Temos consciência, porém, que esses resultados são apenas a primeira de uma série de aproximações sucessivas que devemos fazer para entender a complexidade do nosso objeto. Restam, ademais, uma série de questões que não temos condições de responder até o presente momento e que formam uma agenda de pesquisa para nós e para os demais pesquisados com interesse no tema. O governo foi responsivo às demandas apresentadas pelos empresários do comércio? Qual o grau de sucesso da agenda do setor? Caso não tenha sido, as ações do governo foram mais alinhadas com outra fração da burguesia que não o empresariado comercial? Se compararmos a relação do governo com as diferentes frações burguesas, o comércio de fato apresenta uma relação especial? Os empresários agiram de alguma forma para pressionar por suas demandas? Se sim, como? Se não, por quê?
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Seguimos a sugestão de Codato e Perissinoto (2009) de que, ainda que sejam originários de tradições teóricas e epistemológicas distintas, os conceitos de elite e de classe social podem se complementar — mesmo que com desajustes e defasagens entre si. De um lado, esta junção conceitual nos permite abandonar de vez a ideia de que a classe como um todo possa, enquanto “lugar objetivo nas estruturas sociais”, sem mediações, se constituir em ator político. Na verdade, a classe é uma coletividade socioeconômica representada politicamente por uma elite de classe. O conceito de elite, assim, nos permite operacionalizar o conceito de classe para a análise política. Por outro lado, a junção com o conceito de classe retira o potencial voluntarismo presente nas análises elitistas que desconsideram o peso dos “constrangimentos estruturais” dos conflitos de interesses materiais sobre as lutas políticas no interior do Estado. Desse modo, podemos escapar do “vácuo social” implícito nas análises elitistas que supõem a independência radical do campo da política.↩︎
Para Poulantzas (2019), embora o econômico seja “determinante em última instância”, a posição objetiva na estrutura produtiva da sociedade não é suficiente para caracterizar um grupo, em si, como fração de classe politicamente relevante. Para tanto, é preciso haver na ação do grupo, enquanto classe, a sobredeterminação das dimensões econômica, ideológica e política que o faça constituir uma força social com efeitos pertinentes na cena política. Sem ação coordenada, consciência de seus interesses e projeto político-econômico próprio, um conjunto agentes sociais é uma classe apenas em sentido virtual e potencial. Devemos a inclusão dessa questão teórica no artigo ao professor Armando Boito Jr., que a sugeriu, em sua arguição crítica como debatedor, quando apresentamos os resultados preliminares desta pesquisa no XII Workshop “Empresas, empresários e Sociedade”, realizado virtualmente em junho de 2021, na Universidade de São Paulo.↩︎
São elas: AleSat, Arezzo, Avon, B2W, Bio Ritmo, Bob´s, C&A, C&C, Cacau Show, Caedu, Calvin Klein, Carrefour, Casas Pedro, Cencosud, Centauro, CSD, Cia Hering, Cybelar, Dafiti, Decathlon, DPaschoal, DPSP, Estée Lauder, Ferreira Costa, GPA, Gouvea ecosystem, Grupo Avenida, Grupo BIG, Grupo Boticário, Habib´s, Inbrands, Itapuã Calçados, Kalunga, Leo Madeiras, Leroy Merlin, Livraria Cultura, Lojas Americanas, Lojas Bemol, Lojas Cem, Lojas Leader, Lojas Pompéia, Lojas Renner, Lyon, Magazine Luiza, Marisa, Marisol, McDonald´s, Movida, Mundo do Cabeleireiro, Netshoes, Novo Mundo, Óticas Carol, Pague Menos, Pandora, PanVel Farmácias, Pernambucanas, Petz, Polishop, Quero-Quero, Ráscal, RD, Reserva, Restoque, Ri Happy, Riachuelo, Roldão, Saraiva, Sephora, Telhanorte, Tok&Stok, Via Varejo, Via Veneto, Vivara e Zara.↩︎
Medida Provisória 881/2019. Propunha diminuir a intervenção do Estado sobre a atividade econômica, através do estabelecimento de princípios e garantias do particular sobre o público; além de flexibilizar as normativas sobre o estabelecimento de contratos privados, a abertura de pequenos negócios e sobre os preços.↩︎
Em relação aos dados apresentados no gráfico 6, contamos as citações pelas “reformas” como a Reforma Administrativa, a Reforma da Previdência e a Reforma Tributária. Após a aprovação da Reforma da Previdência, contamos apenas a Administrativa e a Tributária.↩︎
Resumo:
Neste trabalho buscamos analisar a
relação do empresariado comercial com o governo Bolsonaro, entre os anos
de 2018 e 2020. Metodologicamente, o artigo realiza uma análise de
conteúdo das manifestações discursivas de quatro das mais importantes
associações do empresariado comercial do Brasil. Como resultado,
identificamos haver forte apoio às reformas liberais, de maneira ativa,
pautando formas específicas nestas reformas e um engajamento favorável
ao governo, no período eleitoral e em seu primeiro ano. Também
identificamos que os comerciantes se mobilizaram ativamente por pautas
específicas do setor. Quanto à pandemia foi possível observar que todas
as associações defenderam a necessidade de ajuda por parte do governo
para os empresários, mas somente no Instituto para o Desenvolvimento do
Varejo (IDV) identificamos pressão pela reabertura do comércio.
Palavras-chave:
Bolsonaro; Comércio; Empresários;
Economia; Pandemia
Abstract:
In this essay, we seek to analyze the
relationship of Brazilian commercial entrepreneurs with the Bolsonaro
government, between the years 2018 and 2020. Methodologically, the
article carries out a content analysis of the discursive manifestations
of four of the most important associations of commercial entrepreneurs
in Brazil. As a result, we identified that there was strong support for
liberal reforms, actively guiding specific forms of these reforms and a
favorable engagement with the government, in the electoral period and in
its first year. We also identified that merchants were actively
mobilized for specific agendas in the sector. As for the pandemic, it
was possible to observe that all associations point to the need for help
from the government for businessmen, but only at the Instituto para o
Desenvolvimento do Varejo (IDV) we identify pressure for the reopening
of tail stores.
Keywords:
Bolsonaro; Trade; Entrepeneurs;
Economy; Pandemics.
Recebido para publicação em 25/08/2021
Aceito em 01/02/2022