A RELAÇÃO ENTRE ANGÚSTIA E MANIPULAÇÕES CORPORAIS IRREVERSÍVEIS EM TRANSEXUAIS: ASPECTOS PRELIMINARES DE UMA PESQUISA PSICANALÍTICA

Resumo

Intervenções irreversíveis sobre o corpo tornaram-se fenômenos crescentes com o avanço tecnológico. Baseando-se em Freud e Lacan, a psicanalista Paola Mieli argumenta que toda manipulação corporal de natureza irreversível comporta motivações particulares que devem ser analisadas a partir da história de cada sujeito. Nesse cenário, Mieli nomeia de punctum o lugar do próprio corpo que é percebido pelo sujeito como uma fonte de mal-estar, a ponto de gerar a intenção de escamoteá-lo, muitas vezes através de procedimentos corporais irreversíveis. No âmbito dessas questões, o trabalho investiga a repercussão desse encontro com a tecnologia no contexto do acesso a transformações corporais para a transição de gênero. Esse contexto instigou uma pesquisa de mestrado, atualmente em curso, que tem como um de seus objetivos articular o estatuto do punctum com a angústia, bem como analisar como esses aspectos comparecem na relação de sujeitos transexuais com seus corpos. Trata-se de uma pesquisa teórica em psicanálise realizada através de revisão bibliográfica, utilizando-se obras de Freud, Lacan, Mieli e outros psicanalistas de orientação lacaniana. Busca-se articular tais conteúdos à experiência de atendimento a transexuais que reportam a emergência da angústia na relação com determinados traços corporais. Como resultado preliminar, é perceptível que há características corporais que provocam efeito de punctum, inclusive, no que diz respeito a sua interface com a angústia. O incômodo provocado pelo punctum no sujeito transexual, ao arremessá-lo a um estado de embaraço e impedimento, pode sublinhar a complexa relação existente entre a subjetivação da forma corporal e o processo de identificação. A psicanálise mostra-se relevante nesse enquadre, pois, como diz Lacan, é sobre o gume da angústia que o sujeito tem que se sustentar e é sobre ele, portanto, que as análises devem ser conduzidas.