LITERATURA, LOUCURA E MODERNIDADE: UMA PROSA POÉTICA DE ANA CRISTINA CESAR

Abstract

O presente trabalho está inserido no contexto do projeto de pesquisa intitulado “O PODER POÉTICO DA PALAVRA SOB O INFLUXO DA METAFÍSICA OCIDENTAL”, que pretende investigar as maneiras como o discurso literário contemporâneo afasta-se da tradição das belas-letras e desvincula-se da pretensão à consolidação de saberes, sendo nutrido por propostas de pensadores como Maurice Blanchot, Jacques Derrida e Roland Barthes. Nesse sentido, detemo-nos na análise de uma prosa poética da escritora brasileira Ana Cristina Cesar, “na outra noite no meio-fio” (Cenas de Abril, 1979). Temos como objetivo tecer uma “leitura deslizante” sobre o referido texto, com base na proposta da pensadora Shoshana Felman: para ela, a “coisa literária”, assim como a loucura, está definida como uma resistência à interpretação; sendo ambas regidas por “aquilo mesmo que as interdiz”, que as impede de significar de fato. Sendo assim, nossa tarefa de “ler” é a de fazer aparecer aquilo que barra o texto literário, seu sentido interrompido, sua irredutibilidade. Mobilizamos tal perspectiva a fim de analisar como a loucura da palavra caracteriza o poema de Ana Cristina Cesar. Entendemos que “na outra noite no meio-fio” (1979) pode ser caracterizado pela constante “escrita de rupturas e inscrição de repetições”, como já descrito por Felman a respeito do discurso literário da modernidade. Trata-se de um poema-prosa desafiador, caótico no modo em que resiste a uma leitura orientada ao sentido, sendo um excelente exemplar da relação defendida por Felman entre a coisa literária e a loucura. Compreendemos ainda que, ao delirar as fronteiras do código linguístico, num jogo de cenas desviadas e de figuras retomadas, o texto demonstra a força que a palavra poética exerce ao repelir as amarras da interpretação. Nossa leitura deslizante nos possibilita explorar a força de um texto literário, sem buscar para ele o paralisamento de um sentido final. Este trabalho foi realizado com o apoio do CNPq.