Cartas de Graciliano Ramos: uma epistolografia do corpo
Résumé
O consumo crescente de textos que, de alguma forma, trazem o “eu” para o centro da escrita, proliferam desde as décadas de 1970-80 no mercado editorial latinoamericano, dentre eles, no Brasil, as edições de cartas de escritores consagrados da literatura nacional. Para além da “espetacularização do sujeito” (ARFUCH, 2010) ou “biografismo”, defendemos, via Silviano Santiago (2006), a importância de “ler” a vida do autor junto à sua obra para que, a partir do estabelecimento de jogos intertextuais, ampliemos a compreensão da obra artística e aprofundemos o conhecimento acerca da história literária. Partindo do pressuposto de que as experiências pessoal e literária, nas epístolas de Graciliano Ramos, se “tocam” – conforme Nancy (2000) –, apresentamos algumas das reflexões metalinguísticas sobre a natureza da criação literária e do ofício do escritor. Pretendemos com isso ter demonstrado que: 1. as cartas constituem um rico material para a compreensão do universo literário do autor; e 2. o estudo epistolográfico permite-nos não somente “ler” o corpo que escreve como pensar esse corpo como responsável pela ficção que perpassa a escrita das cartas de Graciliano Ramos, que, imerso e absorto no processo de escrita, faz com que a literatura confunda-se com a sua própria vida.Références
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