O Legado Traumático da Escravidão em Torto Arado
Abstract
A escravidão no Brasil e suas implicações sociais após a abolição deixaram profundos traumas na população afro-brasileira. No romance Torto Arado, de Itamar Vieira Júnior, alguns desses traumas são apresentados através das narrativas pessoais das irmãs Bibiana e Belonísia, culminando com o desfecho narrado pela “encantada” Santa Rita Pescadeira. O presente artigo pretende analisar de que forma o trauma cultural é retratado no romance, a partir da definição de Alexander (2004) e Eyerman (2011; 2019). Parte-se do pressuposto que através de referências à história e à tradição de um povo, o romance enfatiza esforços para a manutenção e também para a extinção dessas tradições e da identidade cultural do grupo, como definida por Hall (1990). Ao dar voz às duas irmãs e a uma divindade religiosa, o romance expõe a realidade social de um grande número de afrodescendentes em comunidades rurais, ainda ignorada por muitos brasileiros. A partir da permeabilidade entre ficção e realidade que o romance apresenta, a análise propõe uma continuidade da discussão sobre o legado da escravidão no país e constitui uma tentativa de expandir a reflexão sobre os traumas gerados por ela, bem como os mecanismos de resistência e sobrevivência criados por essas comunidades a partir deles.